quarta-feira, 16 de julho de 2014

O artista inconfessável

[João Cabral de Melo Neto]


Fazer o que seja é inútil.
Não fazer nada é inútil.
Mas entre fazer e não fazer
mais vale o inútil do fazer.
Mas não, fazer para esquecer
que é inútil: nunca o esquecer.
Mas fazer o inútil sabendo
que ele é inútil, e bem sabendo
que é inútil e que seu sentido
não será sequer pressentido,
fazer: porque ele é mais difícil
do que não fazer, e dificil-
mente se poderá dizer
com mais desdém, ou então dizer
mais direto ao leitor Ninguém
que o feito o foi para ninguém.



MELO NETO, João Cabral. Museu de tudo, in: A educação pela pedra e depois
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997, p.58

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